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A estilística de “Burguesinha”: um esboço de leitura

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Seu Jorge
Burguesinha (Seu Jorge)

Vai no cabelereiro
No esteticista
Malha o dia inteiro
Pinta de artista

Saca dinheiro
Vai de motorista
Com seu carro esporte
Vai zoar na pista

Final de semana
Na casa de praia
Só gastando grana
Na maior gandaia

Vai pra balada
Dança bate estaca
Com a sua tribo
Até de madrugada

Burguesinha, burguesinha
Burguesinha, burguesinha
Burguesinha
Só no filé
Burguesinha, burguesinha
Burguesinha, burguesinha
Burguesinha
Tem o que quer
Burguesinha, burguesinha
Burguesinha, burguesinha
Burguesinha
Um croassaint
Burguesinha, burguesinha
Burguesinha, burguesinha
Burguesinha
Suquinho de maçã

A Estilística de Bally se orientou, entre outras coisas, pelo uso que se fez da gramática, considerando, para tal, os aspectos expressivos_relativos à exteriorização do eu_e impressivos_concernentes ao aliciamento do tu.

No texto acima, é relevante a coleta de amostras gramaticais que subsidiam a tessitura estilistica da composição:

a) o uso de uma infinidade de adjuntos adverbiais

-no cabeleireiro
-no esteticista
-o dia inteiro
-de motorista
-com seu carro esporte
-na pista
-final de semana
-na casa de praia
-só
-na maior gandaia
-pra balada
-bate estaca
-com sua tribo
-até de madrugada

b) opção pelos verbos intransitivos, excetuando-se aqueles cujos objetos referem-se poder financeiro

verbos intransitivos

VAI no cabeleireiro (verbo ir, sem complemento)
MALHA o dia inteiro (verbo malhar, sem complemento)
VAI de motorista (verbo ir, sem complemento)
VAI ZOAR na pista (locução verbal sem complemento)
VAI pra balada (verbo ir, sem complemento)
DANÇA bate-estaca (verbo dançar, sem complemento)

verbos transitivos

SACA dinheiro (verbo sacar com objeto direto de coisa)
GASTANDO grana (verbo gastar com objeto direto de coisa)
TEM o que quer (verbo ter com objeto direto de coisa)

Quanto à insistência pela escolha dos adjuntos adverbiais, termos acessórios conforme a gramática, observamos que se cria, no plano da expressão-impressão, a sugestão de que a “personagem central” está envolta em circunstâncias não essenciais e que, portanto, seu agir no mundo é impregnado de futilidade.

Ainda em relação aos adjuntos, é curioso notar que, no mesmo grupo do qual participam noções referentes acoisas (pra balada, na casa de praia etc), figuram expressões “coisificadas” com a antecedência da preposição e o consequente valor adverbial (note-se, por exemplo, que a expressão NO ESTETICISTA, sem a antecedência da preposição em, seria originariamente O ESTETICISTA, do que decorre que todos os atos da burguesinha resvalariam em circunstâncias-coisas).

No respeitante aos verbos, observamos que só os transitivos, que são conotadores do campo semântico DINHEIRO, desmembram-se em objetos, dando maior longevidade às ações, o que, estilisticamente considerando, insinua que, fora as ações que envolvam o aspecto financeiro, qualquer outra prescinde de maiores desenvolvimentos. Não é à toa que todos os outros verbos apresentam-se sem complementação.

Quanto ao esquema das rimas pelas 4 estrofes iniciais, interessante é notar como a regularidade se mantém nas estrofes ímpares, ao passo que as pares são completamente irregulares,o que constitui um excelente indício para a montagem do edificio retórico: no universo de uma burguesinha, a regra é o espaço das individualidades, não dos pares…

Tomando por base, como diria BASILIO, a pejoratividade da forma derivada “burguesinha”, somos levados a crer que estamos diante de uma composição musical cuja finalidade precípua é a de levar o leitor a desmontar a ideologia do capital reinante e, desta feita, insinuar um “novo caminho de salvação”…

A julgar pela crise na atualidade, resultante que foi do colapso dos modelos instituídos. o que fazer? Cair no nihilismo e, à maneira de um Pagodinho, “eixar-se levar pela vida”?


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